SÃO NICOLAU DE FLUE NA FAVELA DO JARDIM GLÓRIA




São Nicolau de Flüe na favela do Jardim Glória

„Meu Senhor e meu Deus, tirai de mim tudo quanto possa afastar-me de Vós.
Meu Senhor e meu Deus, concedei-me tudo quanto possa atrair-me a Vós.

Meu Senhor e meu Deus, tomai-me todo e fazei-me inteiramente Vosso.“
(oração de São Nicolau de Flüe).



(São Nicolau – Paróquia de Nossa Senhora de Lourdes, Helvetia. Crédito da foto:  Padre Marco Antônio Amstalden)

Em 2017 a colônia de Helvetia celebrou solenemente a festa de 600 anos de nascimento de São Nicolau de Flüe, patrono da Suíça. São Nicolau é também chamado de Bruder Klaus, Irmão Klaus e é o santo mais popular da Suíça, sendo sua figura história lembrada e respeitada também pelos não católicos daquele país.
As festividades na colônia aconteceram dos dias 23 e 24 de setembro de 2017 e houve procissão e missa solene, competições esportivas, leilão de gado e homenagem á Eduardo Ambiel, o “leiloeiro de Helvetia”, além do almoço tradicional com pratos típicos. Também na grandiosa festa da Tradição, ocorrida em 29 e 30 de julho do mesmo ano, o aniversário de 600 anos de São Nicolau foi festejado e celebrado pela colônia.

A figura de São Nicolau de Flüe é muito presente na vida dos Suíços e seus descendentes espalhados pelo mundo todo. Na colônia de Helvetia, em Indaiatuba/SP não é diferente, tanto que este santo é também patrono da Paróquia Nossa Senhora de Lourdes, ao lado de São José. Quando da inauguração da paróquia em 1914, São Nicolau de Flüe não havia sido proclamado santo, o que ocorreu somente em 1947, durante o pontificado do Papa Pio XII. Ele morreu no dia 21 de março de 1487, no dia de seu aniversário de 70 anos. Foi beatificado em 1669 e seu corpo está sepultado na igreja de Sachslen. Muitas das famílias suíças que emigraram para o Brasil no século XIX e também entre as que deram origem á colônia de Helvetia, são descendentes de São Nicolau de Flüe, que foi casado e teve 10 filhos. Frei Sigrist descende de São Nicolau de Flüe, tanto pela família SIGRIST (de seu pai, Quito) como pela família AMBIEL (de sua mãe, Lina) sendo parte da 15ª. geração dos descendentes de Nicolau e sua esposa Dorotéia Wyss.

Algumas homenagens prestadas pelos colonos suíços ao seu santo patrono:
Criação da Sociedade Escolar São Nicolau de Flüe: Os primeiros colonos de Helvetia também homenagearam São Nicolau de Flüe colocando seu nome na escola da comunidade, fundada em 1891.  Esta escola foi administrada pelas Irmãs de Santa Catarina e posteriormente pelas Irmãs Beneditinas, que ali permaneceram até 1942, quando o ensino passou a ser ministrado por professoras leigas, sendo Leonor Amstalden a primeira. Pebo foi presidente desta sociedade escolar.

Criação da Paróquia de São Nicolau de Flüe: Dom Constantino Amstalden, quarto bispo da Diocese de São Carlos, nascido em Helvetia e descendente também do santo, criou a Paróquia São Nicolau de Flüe, em sua diocese. Buscou entre os suíços os recursos para esta belíssima construção situada na Rua Pedro Raimundo, 80 - Vila Carmem - São Carlos/SP.

Arnold Gut, ao tornar-se religioso beneditino adotou o nome de Dom Nicolau de Flue Gut. "Filho de imigrantes suíços, Arnold Gut nasceu em Campinas no dia 29 de outubro de 1895. Ainda criança manifestou inclinação para a vida religiosa e ingressou no Seminário de Pirapora e depois no Mosteiro de São Bento, no Rio de Janeiro. Adotou o nome religioso de Nicolau de Flüe Gut em honra do mais importante santo da Suíça. Depois de ser ordenado padre, em 20 de dezembro de 1920, cursou teologia e direito canônico na Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma. Mais tarde doutorou-se em filosofia pela Universidade de Munique, Alemanha. Foi diretor do Colégio São Bento, de São Paulo e, no início dos anos 1940, acometido de eczemas, fixou moradia em Santa Bárbara do Rio Pardo, onde foi nomeado pároco. Entre os anos de 1947 e 1955 e de 1958 a 1962 Dom Nicolau governou a Estância como prefeito sanitário, tempo em que desenvolveu benfeitorias na cidade. Também exerceu a vereança e presidiu a Câmara Municipal. Influenciou na construção do Balneário Estadual, da ponte sobre o Rio Pardo e em inúmeras obras públicas. Foi também o construtor da igreja matriz de Santa Bárbara, templo erguido em estilo helvético. Morreu em 5 de abril de 1982". (Gesiel Junior).


Nos escritos de Frei Sigrist, encontramos quatro referências á São Nicolau de Flüe, que demonstra seu carinho e reverência:

1.       Nesta carta enviada ao tio e padrinho, Eduardo Ambiel, em 23 de setembro de 1979, escrita em Munique, logo após sua chegada á Alemanha, para estudar teologia.  Relata a visita á casa de São Nicolau na companhia de seu primo, Padre Álvaro Augusto Ambiel:

“Tivemos também a graça de entrar na casa em que São Nicolau de Flüe viveu com esposa e filhos. Em pensamento regredi no tempo e busquei viver intensamente aqueles momentos. Depois visitamos seu eremitério, escondido entre os pinheirais. Cenário digno do maior dentre os suíços... E que dizer de Giswil, berço de sua mãe e avó minha? Apenas isto: lá dei livres rédeas ao consolo de não conter as lágrimas. Ela nascera também ela, no lugar digno da maior dentre as suíças... e percebi a imensidão do sofrimento por que passou: morava no Paraíso e, tão jovem, ainda, conheceu o exílio sem regresso... Deixei a Suíça plenamente convicto de que nada de mais belo poderei esperar ver na Europa.  Por hoje é só, fico pelo pouco escrito. Felicidade, padrinho, não lhe desejo, pois já a possui. Receba pois os meus cumprimentos pela vida que soube cultivar e florescer. Pebo”.
2.      Nesta outra carta também enviada á seu tio e padrinho, Eduardo Ambiel em 30 de junho de 1983, quando se preparava, em retiro em Mattacher Kapelle, em Sarnen, para receber a ordenação diaconal:

“Mas se ínsito em buscar mais atrativos ainda para os olhos do corpo e da alma, enxergo bem defronte a mim e para além do lago de Sarnen: Sachseln, Flueli, a terra de São Nicolau. Tudo reunido, em seu conjunto, é uma região de altas montanhas vestidas de bosques e de pastos de um verde luxuriante, de riachos, que, obedientes ás leis da natureza, se precipitam, céleres, encosta abaixo, região das vacas mais belas e mais mansas do mundo, como em que uma universal variedade de flores dão o toque final do encantamento. Sem exagero, padrinho. E não faltam também os belos veadinhos, que todas as manhãs, ou bem á tardinha, insistem em se aproximar da capela em que me abrigo, alegrando-me por vezes com sua abalada rápida para o bosque mais rápido, tão logo um cão do Bauer mais próximo sai ao encalço, sempre sem sucesso para este último, felizmente.”

3.      Nesta correspondência enviada á amiga e colaboradora suíça, Anamarie Walser Amstalden, em 14 de dezembro de 1997:

“Externamente, o Natal entre vocês é mais belo do que entre nós, tendo em vista a neve que cai sem cessar, o que, além disso, oferece clima mais propício para a reflexão, contemplação, oração. Lembro-me sempre da belíssima noite de natal passada com os capuchinhos na casa de sua mãe em Sarnen. Pela manhã a natureza, sol a pino, estava super maravilhosa. O Natal, aqui na Favela, celebraremos ás 20 horas no Centro Comunitário; no ano que vem, se Deus quiser, na Igreja nova que está em fase de construção. Ainda faltam os vitrôs, pintura, altar e bancos. A relíquia de São Nicolau pretendo colocar, incrustrada na parte do altar, frente ao público. Depois da missa será servido sanduiches e refrigerantes a todos os presentes, normalmente umas 400 pessoas. Na manhã seguinte irei para Helvetia, almoçar e passar o dia 25 com a família.”

4.      Neste manuscrito de 1998, ano de sua morte, encontrado em seu barraco, no Jardim Glória, que parece ser o rascunho de uma correspondência enviada á comunidade da Paróquia de São Nicolau de Flüe, em Sachslen, na Suíça, onde está sepultado o corpo do santo:

“Devo ainda agradecer a vossa valiosa colaboração para a construção da nossa capela, que já se encontra em adiantado estado de construção, é muito linda e talvez a inauguremos no próximo Natal. Por tudo isto agradeço a vós de todo o coração.  Mas um especial agradecimento existe ainda e este devemos ao Padre Josef Eberli. Isto porque ele vai enriquecer nossa capela com uma relíquia de São Nicolau de Flüe. Tal fato é por demais significativo: de um lado vincula vossa comunidade definitivamente com os moradores do Jardim Glória, por outro lado me causa imensa alegria, pois sabidamente muitas famílias, inclusive a minha, que no século passado imigraram para o Brasil descendem de Bruder Klaus. Deus vos pague Padre Eberli e a todos vós, saúde e paz em Jesus Cristo”.

Ao lermos estas referências surgem fatos novos e que foram esquecidos durante todos estes anos: Frei Sigrist havia ganho uma relíquia de São Nicolau de Flüe, oferecida pelo Padre Josef Eberli, da Paróquia de Sachslen, onde está sepultado o corpo do santo e que esta relíquia seria introduzida na Capela de São Francisco e Santa Clara, do Jardim Glória, no Natal de 1998 e que seria incrustrada no altar de frente para o público.
Ao que parece esta relíquia não chegou á seu destino, pois em 18 de outubro de 1998 Frei Sigrist morreu em seu barraco. A “irmã morte” não mandou aviso e o levou de surpresa, deixando seus planos e, pelo menos, dois de seus sonhos inacabados:

1.        Substituir os últimos 22 barracos de madeira por casas de alvenaria, totalizando 120 casas construídas com a colaboração de amigos da Suíça e do Brasil, como cita em sua última entrevista publicada pelo Jornal de Piracicaba, no dia 04 de outubro de 1998, dia de São Francisco de Assis. Este sonho foi concretizado no ano seguinte, 1999, pelo grupo de jovens ACJ (Ação da Cidadania Jovem) da Capela de São Francisco de Assis, do Jardim Mercedes, ligada á Paróquia Santuário Nossa Senhora dos Prazeres, sob a coordenação do leigo Lino Sérgio Santos e do Padre Antônio Carlos D’elboux. Esta capela teve Frei Sigrist como capelão por muitos anos e ainda hoje é muito lembrado por esta comunidade, tanto que a comunidade mantém, na sacristia um belíssimo quadro á óleo com a foto do frei e a praça que contorna a capela leva o nome de “Praça frei Francisco Erasmo Sigrist”.
2.       Receber e entronizar a relíquia de São Nicolau de Flüe na Capela do Jardim Glória, pois “tal fato é por demais significativo, de um lado vincula vossa comunidade definitivamente com os moradores do Jardim Glória, por outro lado me causa imensa alegria, pois sabidamente muitas famílias, inclusive a minha, que no século passado imigraram para o Brasil descendem de Bruder Klaus”. Este sonho está incompleto e me parece que estamos vivendo o momento ideal para pensar na sua realização.

Reflexões:
Pebo ingressa no seminário com 12 anos, onde permanece por 07 anos, dedicando-se aos estudos do ginásio e médio; retorna para a casa da família com 19 anos e assume a lida no sítio, tornando-se lavrador por mais de 25 anos, assumindo as dificuldades próprias do trabalho na roça. Nestes momentos reza e pede a proteção de São Nicolau de Flüe, que também foi lavrador e hoje é invocado como santo protetor dos lavradores.
Pebo decide retornar ao seminário com 42 anos, 25 anos depois de ter abandonado a vida religiosa tomado por escrúpulos; não é compreendido por todos, pois seu pai estava com câncer em estado avançado e sua família confiava nele para tocar o sítio em Helvetia; é ordenado sacerdote com 52 anos de idade, sendo que a grande maioria torna-se padre bem mais jovem. Neste momento reza e pede a proteção de São Nicolau de Flüe, que também precisou adiar seu sonho de consagrar-se á Deus por muitos anos e quando se decidiu pela vida eremítica, com 50 anos de idade, também não foi compreendido por toda sua família e amigos, pois precisou deixar a esposa e filhos.
Pebo, somente após um ano a ordenação, no início de 1985, recebe a destinação para que acompanhe dois jovens estudantes numa experiência de inserção junto aos pobres, morando num barraco na favela mais miserável de Piracicaba, tendo que abdicar da vida no Convento dos Frades, onde era vigário paroquial e vice mestre dos noviços. Neste momento reza e pede a proteção de São Nicolau de Flüe, que sai do conforto de sua casa e do convívio de sua esposa e filhos para viver numa cabana, onde realiza seu projeto de vida de oração.
Na favela do Jardim Glória, coloca a fraternidade que é instalada no barraco sob a proteção de Nossa Senhora da Glória e  luta para conseguir verbas para a construção da bela Capela de São Francisco de Assis e Santa Clara, colocando um detalhe que demonstra seu grande amor á Maria, mãe de Deus, um grandioso e visível M encima da porta principal, fazendo com que os fiéis entrem e saiam sob a proteção de Nossa Senhora. Neste momento, ao contemplar a construção quase pronta, pouco antes de sua morte, reza e pede a proteção de São Nicolau de Flüe, grande devoto de Maria, que não deixava de rezar o rosário, nem mesmo quando cultivava os campos.




A belíssima homenagem a Nossa Senhora, o M de Maria, encima da entrada principal da Capela do Jardim Glória. Débora e seu filho, com Dalva e Rozangela.



Relíquia de São Nicolau de Flüe, venerada na Paróquia de Nossa Senhora de Lourdes, de Helvetia.



Eduardo Ambiel, tio e padrinho de Frei Sigrist






Leonor Amstalden, irmã de Dom Constantino, que foi 4º bispo da diocese de São Carlos em visita á Paróquia de São Nicolau de Flue, criada por seu irmão, ladeada pelos Padre Eduardo Malaspina, (eleito bispo auxiliar da Diocese de São Carlos) e padre Robson Caramano.









Quadro de Nossa Senhora da Glória, padroeira da Fraternidade dos Frades Menores Capuchinhos da favela do Jardim Glória. Frei Sigrist era o guardião desta fraternidade.







Comentários

Anônimo disse…
Gostei muito do capítulo,bem completo,fiquei apaixonado pela história.Rogai por nós São Nicolau.
Unknown disse…
Hoje,05/01/2020, pela primeira vez, ouvi falar de Sao Nicolau, Frei(na Rede Vida)!!!Que perseverança dele e quanto Am9r de D. Dorotéa e Filhos. Sao Nicolau de Flüe, rogai por nós!!! Gratidao por postar tao santas e ricas informaçoes. Meu none é Rita Maria R.*

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