CARTA ABERTA AO PREFEITO DE PIRACICABA E AOS SEUS SECRETARIOS

Sou um barraco de madeira. Um simples e pobre barraco de madeira do Jardim Gloria. Talvez o senhor, prefeito Luciano Almeida, me conheça. Alguns de seus secretários me conhecem e até já estiveram aqui em outras ocasiões. Muitos me conhecem e me visitam. Tenho historia para contar e guardo dentro de mim muita historia. Mas vou me apresentar. Fui construído no inicio da ocupação que gerou o Jardim Gloria. Quem me construiu foi o Isaias, filho de Dona Joana, a primeira moradora daqui. Por falar em Dona Joana, ela esta forte e firme, no alto de seus 87 anos. Em 1985 chegaram os Frades Capuchinhos para uma missão na então favela. Vieram para morar num barraco, como moravam outras 120 famílias. Acompanhados pelo Padre Vicente Tonetto, da Paroquia do Itapuã, me escolheram para ser a casa dos frades. Tornei-me a FRATERNIDADE NOSSA SENHORA DA GLÓRIA e por 17 anos abriguei dezenas de seminaristas e religiosos capuchinhos. Foi um período intenso, pois o meu morador mais ilustre, frei Sigrist, recebia muitas visitas e fazia questão de trazer muitas pessoas para cá. Vieram visitas do Brasil todo e de exterior, principalmente da Suíça. Todos os prefeitos anteriores estiveram aqui para um bate papo e para tratar de melhorias para a comunidade. Éramos 120 barracos de madeira, em péssimas condições, muito mal construídos, com restos de madeira e outros refugos. Graças ao trabalho incansável de frei Sigrist e da comunidade capuchinha estes outros barracos desapareceram, dando lugar á casas de alvenaria, bem construídas e bem fundamentadas. Eu fui o único barraco que restou. E restei justamente para lembrar que existiu um tempo muito ruim em que as pessoas sofriam em seus barracos, num lugar esquecido por todos. Hoje este tempo e só passado. Em 1998, num domingo, 18 de outubro, aconteceu um fato inesquecível na minha cozinha. Frei Sigrist morreu, vitima de infarto, ao preparar o café. Foi encontrado já sem vida. Sendo velado pelo cão e pela gatinha. Viveu e morreu como um filho de São Francisco. Em 2002 os frades foram embora e eu permaneci, cultuado e cuidado pela comunidade e em especial pela Dona Joana. Nunca mais fui habitado ou tive outro fim, que não fosse ser o MEMORIAL DE FREI SIGRIST e da presença capuchinha no jardim Gloria. Os frades deixaram aqui todos os pertences, documentos, fotos e obras de arte do período em que aqui viveram. Em 2010 eu estava quase desmoronando, totalmente destruído pelo tempo e os moradores apelaram ás autoridades e eu fui dignamente restaurado. Graças ao trabalho da vereadora Dra. Marcia Pacheco e da Emdhap fui restaurado e tornei-me um belo espaço da comunidade. Neste tempo foi aberto um processo para que eu fosse tombado como PATRIMONIO HISTORICO DO MUNICIPIO DE PIRACICABA. Este processo arrastou-se ate 2020 quando finalmente fui tombado pelo CODEPAC e tornei-me patrimônio histórico de Piracicaba, com muito orgulho. Até porque além de mim só existe um outro barraco de madeira que é tombado como patrimônio histórico e fica em Xapuri, no Acre, onde viveu o ambientalista Chico Mendes. Senhor Prefeito de Piracicaba e senhores secretários, após esta apresentação venho implorar pela ajuda dos senhores. Estou novamente em péssimas condições de preservação. Tenho goteiras em todos os cômodos que está destruindo o meu acervo, que é simples e humilde, mas não menos importante. A parte elétrica esta em curto, com perigo eminente de um incêndio que seria fatal para minhas paredes de madeira e para meus vizinhos. Por falar em paredes, as tábuas estão apodrecidas e precisam de manutenção. Tenho ainda outros problemas jurídicos e criminais sérios, que foram descritos pelo historiador Claudinei Pollesel, membro do Instituto Histórico e Geografico de Piracicaba. Este documento foi protocolado na prefeitura e desde o ano passado circula por ai sem ser notado. Recentemente o vereador Pedro Kawai se propôs a me ajudar, sem muito sucesso por enquanto. Senhor Prefeito, Senhores Secretários só quero e peço para ser tratado como PATRIMONIO HISTORICO DO MUNICIPIO DE PIRACICABA, dignamente tombado pelo CODEPAC. Caso o senhor não saiba pertenço ao município, com escritura passada desde que o bairro foi regularizado. Meu proprietário é a PREFEITURA MUNICIPAL DE PIRACICABA. Por amor á historia do Jardim Glória e de Piracicaba, preciso de manutenção, enquanto é tempo. De inicio eu ficaria feliz se trocassem algumas telhas, algumas tabuas e revisassem a fiação elétrica. Escrevi esta carta aberta, pois tentei todas as outras formas e nenhuma surtiu efeito. Como sou um barraco e não falo e nem escrevo pedi ao historiador Claudinei Pollesel, membro do IHGP que escrevesse por mim. Por favor, aguardo uma resposta, enquanto estou de pé.

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